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Bruno Tarsis

A delicada dança entre interações e processos no mundo ágil

Atualizado: 29 de set. de 2023

No universo do desenvolvimento de software, o termo "ágil" tornou-se uma palavra de ordem. As equipes estão adotando princípios ágeis para criar produtos mais eficientes e valiosos, e um dos pilares desse movimento é "Indivíduos e interações mais que processos e ferramentas", mas, como em qualquer dança complexa, encontrar o equilíbrio entre interações humanas e processos é uma tarefa desafiadora.


No mundo ágil, a dicotomia entre interações humanas e processos é uma constante batalha. Enquanto os princípios ágeis enfatizam a importância das pessoas, muitas vezes as equipes enfrentam dificuldades em entender a necessidade de estabelecer um mínimo de processo.


Vamos explorar essa complexidade e as razões por trás dessa dificuldade.


O Manifesto Ágil e seus Princípios


Antes de aprofundarmos na discussão sobre a complexidade da manutenção desse equilíbrio, é importante lembrar o contexto em que o pilar "Indivíduos e interações mais que processos e ferramentas" surgiu. Ele faz parte dos 4 pilares ágeis que complementam o Manifesto Ágil. Esses pilares foram criados como resposta à rigidez dos processos tradicionais de desenvolvimento de software e visam colocar o ser humano no centro do processo.


E, para isto 17 pessoas se reuniram para elaborar uma alternativa que permitisse realizarmos o processo de construção do produto mais flexível, e iniciar na gestão uma reflexão de que a base do sucesso está essencialmente no que consideramos como valor ao nosso cliente, como também em todas as pessoas que participam do processo. E, não apenas no planejamento detalhado onde o foco principal estava em torno de um cronograma, documentos super elaborados plano detalhados e nos recursos envolvidos.


A Importância das Interações Humanas


O pilar em questão enfatiza que, embora processos e ferramentas sejam fundamentais, eles não devem se sobrepor às interações humanas. Isso significa que, mesmo seguindo métodos, frameworks, filosofias ágeis como Kanban, Scrum ou Lean, é vital lembrar que as pessoas que compõem a equipe são a força motriz por trás do sucesso do projeto.


As interações humanas englobam comunicação eficaz, colaboração, empatia e uma compreensão profunda das necessidades e objetivos do cliente. São as conversas, discussões e resoluções de conflitos que, muitas vezes, resultam em soluções mais inovadoras e adequadas.


O foco nas interações humanas é, sem dúvida, uma das características mais cativantes do mundo ágil. A ideia de colaboração, comunicação aberta e empatia entre os membros da equipe parece promissora e inspiradora. Quando as pessoas se sentem valorizadas e ouvidas, sua motivação e criatividade podem atingir níveis notáveis. No entanto, é aí que reside a armadilha.


O Paradoxo da Falta de Estrutura


Encontrar o equilíbrio entre essas interações humanas e a necessidade de processos bem definidos pode ser um desafio. Processos são essenciais para fornecer estrutura, previsibilidade e controle em um projeto. Eles ajudam a garantir que todas as etapas sejam seguidas, os prazos sejam cumpridos e a qualidade seja mantida.


Quando o foco nas interações humanas é excessivo, pode haver falta de direção e coordenação, levando a atrasos e confusão. Por outro lado, quando a ênfase nos processos é extrema, a equipe pode se sentir alienada, desmotivada e restringida pela burocracia.


Muitas equipes ágeis, ao abraçar fervorosamente o aspecto humano, podem evitar a definição de processos mínimos. Isso pode levar a uma série de desafios:


  1. Falta de coordenação: Sem processos mínimos, as equipes podem lutar para coordenar suas atividades, isso resulta em confusão sobre quem faz o quê e quando.

  2. Inconsistência na qualidade: A ausência de processos pode levar a inconsistências na qualidade do trabalho, já que não há padrões para seguir.

  3. Perda de eficiência: Processos mínimos são projetados para tornar o trabalho mais eficiente, e sua ausência pode levar a retrabalho ou atrasos.

  4. Dificuldade na escalabilidade: À medida que a equipe cresce, a falta de processos pode se tornar insustentável, e novos membros podem se sentir perdidos sem diretrizes claras.


Por que, então, as equipes ágeis muitas vezes relutam em estabelecer um mínimo de processo?


Algumas razões incluem:


Medo da burocracia


A burocracia, para muitos de nós, é como uma sombra escura que paira sobre nossas vidas. É aquele emaranhado de regras, formulários, carimbos e processos intermináveis que, por vezes, nos fazem sentir como se estivéssemos presos em um labirinto intransponível.


O medo da burocracia é, na verdade, um sentimento profundamente humano. Quem não teve aquele frio na barriga ao enfrentar uma pilha de papelada, ou a ansiedade de ter que lidar com procedimentos complexos e demorados? É como se a burocracia tivesse o poder de nos transformar em meros números em vez de pessoas.


O que nos causa tanto medo é a sensação de impotência que a burocracia pode trazer. Muitas vezes, somos confrontados com regras rígidas e processos aparentemente irracionais que não parecem levar em consideração nossas necessidades ou desafios individuais. Parece que estamos perdendo tempo precioso preenchendo formulários e seguindo diretrizes sem sentido.


No entanto, é importante lembrar que a burocracia não é intrinsecamente má. Ela existe para trazer e nos ajudar na organização, além de garantir que as coisas funcionem de maneira justa e equitativa. Para superar esse medo da burocracia, é essencial a busca de maneiras para humanizá-la.


Isso significa simplificar processos, tornar as regras mais compreensíveis e acessíveis e, acima de tudo, lembrar que por trás de cada papel e carimbo, há seres humanos com necessidades e aspirações. E por essas razoes que muitas equipes ágeis com experiência anteriores com processos pesados e burocráticos hesitem em criar qualquer processo, com medo de voltar a essa realidade.


A atração do "Ágil Puro"


Existe uma visão idealizada do ágil que retrata equipes auto organizadas e sem qualquer processo formal. Isso pode levar à rejeição de qualquer forma de processo.


No mundo da gestão de projetos e desenvolvimento de software, há uma visão que cativa a imaginação de muitos: o cenário ágil, onde equipes trabalham de forma autônoma, livres de processos formais e regras rígidas.


É uma visão que nos leva a imaginar um oásis de criatividade, liberdade e inovação em outras palavras uma visão idealizada do ágil que retrata equipes auto organizadas e sem qualquer processo formal e isso pode levar à rejeição de qualquer forma de processo pelas pessoas.


Agora, imagine uma equipe reunida, sem a rigidez de hierarquias tradicionais, tomando decisões em conjunto e guiada por sua paixão pelo projeto. Não há um manual grosso de processos, não há checklists intermináveis a serem seguidos, apenas o fluxo natural de trabalho. Essa visão do ágil promove a ideia de que, com confiança e liberdade, a equipe pode atingir resultados surpreendentes.


No entanto, enquanto essa visão é cativante, também é importante reconhecer suas nuances e desafios.


Primeiro, a realidade é que nem todos os projetos se encaixam perfeitamente nesse molde. Algumas iniciativas exigem mais estrutura, documentação e conformidade, o que pode ser difícil de alcançar em um ambiente totalmente sem processos formais mínimos.


Além disso, a autonomia requer responsabilidade, equipes auto organizadas precisam ter um alto nível de maturidade e autodisciplina para tomar decisões sábias e manter o foco. Nem todos os membros da equipe estão prontos para esse nível de responsabilidade, aí que as diretrizes e processos podem ser úteis.


Outro desafio é a escalabilidade, à medida que uma organização cresce, pode ser difícil manter a mesma agilidade e autonomia. Às vezes, algum grau de formalidade é necessário para garantir que as equipes mantenham um alinhamento consistente com os objetivos da organização.


A visão idealizada do ágil é, sem dúvida, inspiradora e valiosa. Ela nos lembra que a criatividade e a autonomia são elementos fundamentais para a inovação. No entanto, é importante equilibrar essa visão com a realidade do projeto, da equipe e da organização. Às vezes, um toque de padronização pode ser um aliado, permitindo que as equipes alcancem seu potencial máximo enquanto mantêm a essência do ágil: a capacidade de adaptação, a colaboração e a busca contínua por melhores maneiras de fazer as coisas.


Falta de conscientização


Em qualquer equipe, quando se trata da adoção de uma abordagem ágil para a gestão de projetos, muitos membros podem estar animados e prontos para abraçar a mudança. No entanto, há casos em que alguns colegas podem não estar totalmente cientes dos benefícios de ter processos mínimos e veem isso como uma restrição, não como uma ajuda.


Trazendo um cenário, fictício, pense em uma equipe onde alguns membros, empolgados com a agilidade, veem os processos mínimos como uma restrição desnecessária. Eles podem pensar: "Por que precisamos de processos quando podemos nos adaptar rapidamente às mudanças?". Essa perspectiva, embora possa parecer resistente, muitas vezes surge da falta de compreensão.


Para essas pessoas, a noção de processos mínimos pode parecer oposta à agilidade, como se estivesse tirando a liberdade e a flexibilidade que eles valorizam tanto. Eles podem não perceber que, na verdade, processos mínimos podem ser a base que permite a agilidade florescer.


A falta de conscientização sobre os benefícios dos processos, definidos minimamente, não é uma barreira intransponível. Com paciência, educação e uma abordagem colaborativa, é possível alinhar a equipe e permitir que todos desfrutem dos frutos da gestão ágil com processos que são mínimos, mas eficazes.


Estratégias para manter o equilíbrio


Para manter o equilíbrio entre interações e processos, as equipes ágeis podem adotar algumas estratégias. A solução não é abandonar completamente os processos em prol das interações humanas, nem o contrário. Em vez disso, o segredo está em encontrar o equilíbrio certo. Abaixo alguns exemplos de estratégias:


  1. Comunicação clara: Priorize a comunicação transparente e eficaz, isso envolve ouvir atentamente, fazer perguntas e compartilhar informações de maneira aberta.

  2. Flexibilidade: Esteja disposto a ajustar os processos quando necessário, nem todos os projetos são iguais, e a capacidade de se adaptar é fundamental.

  3. Liderança servidora: Líderes devem apoiar, capacitar e remover obstáculos para suas equipes, permitindo que elas prosperem em um ambiente ágil. Porém, em certos casos é o papel do líder orientar, guiar e influenciar as pessoas e para isso crie uma relação de confiança com todos. Afinal segundo John Maxwell, citando Leroy Eims, em seu livro As 21 Irrefutáveis Leis da Liderança: Uma receita comprovada para desenvolver o líder que existe em você": "Um Líder é aquele que vê mais dos que os outros, vê mais longe que os outros e vê antes dos outros".

  4. Feedback contínuo: Incentive a cultura de feedback construtivo para que as pessoas possam aprender e melhorar constantemente, ou seja, permita que a equipe participe ativamente na definição dos processos e ofereça feedback regularmente para ajustes contínuos.

  5. Treinamento e desenvolvimento: Investir no desenvolvimento das habilidades interpessoais dos membros da equipe pode fortalecer as interações humanas, além de informar a equipe sobre os benefícios de processos mínimos, como: maior eficiência, consistência e escalabilidade

  6. Processos leves: Em vez de processos pesados, opte por processos leves e adaptáveis que se ajustem às necessidades da equipe, do projeto e da empresa.

  7. Cultura de melhoria: Cultive uma cultura que valorize a melhoria contínua e esteja disposta a ajustar os processos conforme necessário.


O equilíbrio entre interações e processos é uma parte essencial da jornada ágil, enquanto processos fornecem a estrutura necessária, as interações humanas dão vida ao projeto. Como em uma dança, é preciso prática, flexibilidade e compreensão mútua para alcançar uma harmonia duradoura. Ao lembrar que são as pessoas que fazem a diferença, as equipes ágeis podem colher os benefícios da agilidade sem perder de vista o humano no centro de tudo.


Por isso é importante abordar esse tema com tranquilidade e sabedoria. Assim em vez de impor processos, é mais eficaz educar os colegas sobre os benefícios da construção mínima de processos. E demonstrar que os frutos colhidos serão:


  • Estrutura sólida: Os processos não restringem, mas sim fornecem uma base sólida para a equipe, o que ajuda a manter o foco e a organização, especialmente em projetos complexos.

  • Qualidade e garantia de consistência: Processos mínimos ajudam a manter a qualidade e a consistência do trabalho ao longo do tempo, isso é essencial para a satisfação do cliente.

  • Fácil comunicação: Eles promovem a comunicação eficaz, tornando mais claro quem faz o quê e quando, reduzindo a confusão e os mal-entendidos.

  • Adaptar-se à necessidade: À medida que a equipe ou o projeto crescem, processos mínimos podem ser flexíveis o suficiente para se adaptar às novas necessidades.


Além disso, encoraje a colaboração e convide os membros céticos para discutir como os processos podem ser ajustados para atender às suas preocupações. Isso não apenas ajuda a construir um entendimento compartilhado, mas também pode levar a melhorias reais nos processos.


Assim encontrar o equilíbrio entre interações e processos no mundo ágil é uma jornada que exige adaptação e flexibilidade. Compreender que os processos podem ser uma ferramenta poderosa para capacitar as interações humanas, em vez de restringi-las, é um passo crucial para o sucesso em um ambiente ágil.

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